Thursday, April 16, 2009

E POR FALAR EM FUTURO, ÁGUA, PARA ONDE VAI VOCÊ?

Foto por Helio Rocha

Pagamento pelo uso da água alerta empreendedor para o risco da escassez

O que tem sido feito pela preservação da água e de seus ciclos? Seria repetição indagar outra vez, se a água não fosse fonte de sobrevivência do Homem no Planeta, principal garantia de vida para as gerações futuras. Não foi à toa que, para acompanhar a trajetória da gestão dos recursos hídricos, do local ao mundial, a Organização das Nações Unidas (ONU), criou o Dia Mundial da Água (22 de março).
Em Minas Gerais, para comemorar a data, o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) realizou em parceria com a Assembléia Legislativa do Estado (ALMG) e o Fórum Mineiro de Comitês de Bacias Hidrográficas o 8º Fórum das Águas. Entre os dias 23 a 27 de março, palestras, mini-cursos e debates serviram para avaliar os “Avanços e desafios da política das águas em Minas Gerais”, aliás, título da primeira discussão do ciclo, na ALMG.
A cobrança pelo uso da água, que deve ser implantada até o final de 2009 em diversas bacias hidrográficas do Estado, foi tema amplamente discutido. A medida, prevista na Lei 13.199, e regulamentada pelo Decreto nº 41.578, de 2001, vai atingir os 51 municípios inseridos na área do rio das Velhas, incluindo a Região Metropolitana de BH; as bacias do Araguari, no Triângulo; a do Pomba/Muriaé; e do Preto/Paraibuna. De acordo com o Igam, a cobrança não será aplicada aos pequenos produtores, mas aos grandes empreendimentos industriais e de irrigação, além de concessionárias de abastecimento de água, que já prevêem o repasse de até 3% para o consumidor.
Para o secretário de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, José Carlos Carvalho, a cobrança representa o avanço da lei. “Há um esforço pela efetividade da cobrança do uso da água, mas não é fácil colocar em execução. Há a necessidade de valorar o uso dos recursos naturais, não para onerar. Pagamento para uso da água é para contribuir com fiscalização nas bacias”. Segundo ele, a cobrança está condicionada à criação de agências das bacias hidrográficas, que definirão valores e aplicação dos recursos. O secretário destacou que dos 36 comitês previstos na legislação, 34 já foram instituídos e dois estão sendo criados.

Neste sentido, o representante do Fórum Mineiro de Comitês de Bacias, Mário Dantas, lembrou que, apesar das implantações, ainda faltam recursos financeiros, pessoal de apoio, equipamentos, meios de comunicação e internet. O representante sugeriu a criação de um sistema de informação sobre os recursos hídricos para uso dos comitês. “O sistema de informação dos recursos hídricos iria economizar muito com o gasto que há na elaboração de planos diretores de bacias”.

Conforme dados da ONG WWF, a irrigação na agricultura responde por cerca de 70% do consumo de água mundial; 20% vão para a indústria; e os 10% restantes destinam-se ao uso doméstico. No que se refere ao gasto do setor industrial, o pagamento pode promover a conscientização do uso adequado do recurso. Durante mini-curso do Fórum, a gerente de meio ambiente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Ana Cristina da Silveira, disse as empresas não estão considerando a cobrança como um imposto, mas como forma de colaboração. Ela garantiu que quinze empresas ligadas à Associação Peixe Vivo/AGB - Peixe Vivo, já contribuem para viabilizar a gestão da bacia hidrográfica do rio das Velhas, antes mesmo da prática da cobrança. Sob o mesmo ponto de vista, Maria de Lourdes Pereira dos Santos, engenheira da Cia Vale do Rio Doce, considerou que a medida não será impactante para o setor. No entanto, ela ressalvou que as discussões devem continuar sendo compartilhadas, com justiça e adequação.
O gerente de meio ambiente da Fiemg, Wagner Costa, disse que não será fixado um valor padrão de repasse. Segundo ele, caberá a cada setor decidir se vai adicionar o gasto nos preços dos produtos, ou se inclui a ação em programas de responsabilidade social, em benefício do meio ambiente. “Para a indústria, tudo é uma questão de oportunidade e a cobrança da água vai demandar análises de custo e benefícios”, explicou.
Foto por Helio Rocha

A agricultura responde por cerca de 70% do consumo de água mundial

Já com relação à agricultura, o setor mineiro ainda se mostra resistente à nova aplicação. Responsável por quase 40% da produção mundial de alimentos e maior consumidora dos recursos hídricos disponíveis, a agricultura irrigada influencia na degradação de água, solo e mata ciliar. O secretário-adjunto da Agricultura de Minas Gerais, admitiu o desmatamento na agricultura como principal problema ambiental do meio rural. “São imensas áreas de solos desnudos e a água não vai para o seu aconchego”, disse durante o Bate-Papo no Sisema, no penúltimo dia do Fórum.
Paulo Romano analisou que a rentabilidade do setor é baixa e o risco é alto, para pequenos e grandes produtores, já que as safras variam de acordo com condições climáticas e outros eventos. Para ele, esse é um dos motivos da resistência do setor quanto à cobrança. “O motivo da resistência é também uma questão cultural, o agricultor, pela sua própria atividade, ficou isolado do processo”, disse, acrescentando que o produtor rural precisa se aproximar mais da discussão para entender a demanda. 
Crédito da Imagem: Márcio Angelo
DESPERDÍCIO E POLUIÇÃO

Ainda falta mobilização conjunta para cuidar da água

Além da cobrança pelo uso da água, outro tema discutido no Fórum foi o papel do cidadão na preservação dos recursos hídricos, sobretudo no seu ambiente local. O desinteresse da sociedade em reduzir consumo de água e esgoto lançado na rede pública, foi considerado desafio de gestão. “Gestão tem avanços, mas tem que contar com participação de cada segmento, estado, nação, empresas, sociedade. São olhares diferentes e que têm que convergir para a sustentabilidade”, articulou a diretora-geral do Igam, Cleide Pedrosa.
“Precisamos ter uma disposição final adequada do lixo urbano, para evitar que, com as chuvas, o lixo seja carregado para dentro do leito do rio. É preciso fazer também um trabalho com os agricultores para reduzir o uso de agrotóxico, ou seja, há um conjunto de atividades que estamos articulando”, ponderou o secretário José Carlos Carvalho.
A poluição nos corpos d’água por sofás velhos, animais mortos abandonados nas águas e lixo lançado em bocas-de-lobo e bueiros, são exemplos de contribuições dos cidadãos que, segundo o secretário, cobram do governo águas limpas, mas se esquecem da parcela que lhes cabe na degradação dos rios.
Para se ter uma idéia de quanto custa a poluição, o governo vai gastar R$ 1,3 bilhão para revitalizar a bacia do rio São Francisco. A chamada Meta 2010 é um projeto do Manuelzão, Governo do Estado e Copasa que propõe navegar, pescar e nadar nesse rio, e onde já foram aplicados cerca de R$ 550 milhões.
Na agenda de programação do Fórum, vinte e seis prefeitos de municípios mineiros, inseridos na bacia do rio das Velhas, se reuniram no Palácio da Liberdade e assumiram um compromisso com a Meta 2010. “Existem medidas de âmbito municipal que, se não forem tomadas, tornam inócuo o nosso esforço e até é um desperdício do recurso que nós estamos aplicando”, explicou o governador Aécio Neves.
O despejo de esgoto e lixo na bacia os municípios é considerado entrave para o sucesso do programa, sendo os municípios de Sabará e Sete Lagoas citados como poluidores potenciais. O coordenador geral do projeto Manuelzão, da UFMG, Apolo Heringer, pediu a integração da sociedade como um todo, incluindo não somente as prefeituras, mas os setores agropecuário e industrial.
Crédito da imagem Wellington Pedro

Apolo Heringer pede mobilização de setores para recuperação do rio das Velhas

O governador autorizou a Copasa a investir mais R$ 239 milhões na bacia do Velhas para o biênio 2009/2010 e o Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema) a usar R$ 20 milhões na destinação adequada de lixo urbano que atinge a área. Em contrapartida, as administrações municipais garantiram, entre outras ações, favorecer políticas sustentáveis de uso e ocupação do solo, de coleta e destinação adequada do lixo e de manutenção da qualidade dos cursos d'água.
Entre as conquistas do projeto, a mais festejada é a volta dos peixes ao rio. O biomonitoramento realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), confirmou que peixes que subiam somente 250 km na bacia, hoje já estão ao longo de 580 km, ocupando áreas antes degradadas. Outro aspecto favorável se refere ao esgoto coletado que já atingiu o percentual de 57,33%. A criação da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE do Onça), eliminou outros 207 lançamentos de esgoto. 

Crédito da imagem Wellington Pedro

Secretário de Meio Ambiente, José Carlos Carvalho, também fala da importância da mobilização de todos os setores para o sucesso de gestão das águas.
 
O secretário José Carlos Carvalho, disse que 2010 é uma data simbólica e que os trabalhos para melhorar a qualidade de vida na bacia hidrográfica do rio das Velhas vão continuar após a data limite. De acordo com dados do projeto, a próxima fase será de investimentos na recuperação de áreas florestais degradadas - com ênfase na recuperação de matas ciliares – e atividades de educação ambiental.
Além da Bacia do rio das Velhas, os níveis de “Índice de Qualidade das Águas” (IQA) no Estado foram considerados ‘bom’ e ‘médio’ em cerca de 80% das águas. Esta foi a conclusão do Mapa da Qualidade das Águas, divulgado pelo Igam. O estudo revela que a qualidade das águas de Minas em 2008 permaneceu quase nos mesmos níveis do ano passado. “O resultado demonstra que estamos conseguindo controlar o impacto das pressões econômicas e populacionais em nossos recursos naturais”, disse o secretário José Carlos, considerando o resultado positivo porque revela o controle do estado, frente ao aumento da população e do uso da água. 

Crédito da Imagem: Georgiana de Sá

Simone Lage de Araújo, gerente setorial de Meio Ambiente da Refinaria Gabriel Passos (Regap), garantiu que a Petrobrás está investindo na adequação de efluente para reuso em torre de resfriamento, ao lado do gerente de meio ambiente da Fiemg, Wagner Costa, que disse que não será fixado um valor padrão de repasse diante da cobrança de uso da água.


AS MIL FACES DA ÁGUA

O risco de escassez de água gera mudanças em processos produtivos e de consumo

No sentido de economizar ou para se encaixar na prática do desenvolvimento sustentável, muitas empresas descobriam nas tecnologias oportunidades de reuso da água. Durante a discussão do tema “A Indústria Mineira e a Gestão das Águas”, José Ângelo Paganini, da Usiminas, falou que a siderúrgica trocou aterros sanitários pelo co-processamento de resíduos, no sentido de aproveitar sobras em fornos de cimenteiras. “Com isso, ficamos livres dos passivos. Os aterros, mesmo após encerramento, exigiam cuidados posteriores”, disse, realçando que a medida evita riscos de lançamento de resíduos em aterros ou cursos d’água.
Simone Lage de Araújo, gerente setorial de Meio Ambiente da Refinaria Gabriel Passos (Regap), garantiu que o reaproveitamento de água da refinaria chega a 25% e que a Petrobrás está investindo na adequação de efluente para reuso em torre de resfriamento. Ela considerou que cada litro de petróleo consome um litro de água e que, para atender os novos padrões de qualidade do diesel, mais água será empregada. “Minimizar um impacto ambiental gera outro impacto, que é o aumento na demanda por água”, disse.

Crédito da Imagem: Georgiana de Sá

Beatriz Borges Botelho, analista da Divisão de Ações Mercadológicas da Copasa, sobre a instalação de medidores individualizados nos condomínios. Segundo ela vai gerar a inibição de desperdícios, redução de consumo e consequente queda no faturamento da concessionária.

A parcela da água para consumo da população foi discutida pela Cemig - Companhia Energética de Minas Gerais e Copasa - Companhia de Saneamento de Minas Gerais, que promoveram palestras durante o evento. Beatriz Borges Botelho, analista da Divisão de Ações Mercadológicas da Copasa, falou que a concessionária está instalando medidores individualizados nos condomínios, em conformidade com a Lei Estadual nº 17.506, de 29 de maio de 2008.

Conforme a analista, o serviço, que só pode ser implantado mediante 100% de adesão dos proprietários, vai gerar a inibição de desperdícios, redução de consumo e consequente queda no faturamento da concessionária. "Não é lucro para a Copasa, mas é o certo. Todo mundo quer morar num prédio com hidrômetro individual, com racionalização de consumo e valor".

Crédito da imagem: Georgiana de Sá

O superintendente de Planejamento de Geração e Transmissão da Cemig, Evandro Leite Vasconcelos defendeu novos hábitos de consumo e sugeriu a instalação de aquecedores solares para diminuir gastos, sobretudo dos chuveiros.

O superintendente de Planejamento de Geração e Transmissão da Cemig, Evandro Leite Vasconcelos defendeu novos hábitos de consumo e sugeriu a instalação de aquecedores solares para diminuir gastos, sobretudo dos chuveiros. "A energia elétrica é cara e nobre, não deveria ser gasta para esquentar água de chuveiro”. O palestrante ouviu do público sugestões para que a Cemig criasse parcerias com o governo a fim de tornar os aquecedores solares acessíveis a todos e que instituísse uma maior interatividade com os Comitês de Bacias Hidrográficas. 
Por Georgiana de Sá - Exclusivo para o jornal Ambiente Hoje, da Amda.

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